quarta-feira, 19 de abril de 2017

O reconhecimento na história de Judá e Tamar

A narrativa encontrada no capítulo 38 do livro do Gênesis é um tanto quanto estranha aos olhos do leitor que dela se aproxime pelas primeiras vezes. Basta observarmos que os capítulos finais do livro tratam da história de José, o filho mais novo de Jacó que, vendido aos ismaelitas, foi dado como morto por seu pai. 
Inserida no meio desta longa novela, a narrativa de Tamar parece destoar dos capítulos que estão ao seu redor, no entanto, apresenta referências que a situam como uma breve cena emoldurada pelo enredo dos demais capítulos. 
Gostaríamos aqui de realçar um destes aspectos, qual seja, o do reconhecimento. O tema que perpassa esta narrativa e estabelece sua ligação com a narrativa de José é exatamente este, como bem observara Robert Alter em A arte da narrativa bíblica (2007). Judá é envolvido pela estratégia de Tamar por não reconhecê-la: ele vê suas vestes e pensa que é uma prostituta. Depois, quando se diz que ela está grávida, ele ainda não reconhece ser seu o filho, apenas reconhecerá aquilo que é o distintivo de si mesmo: o anel, o cordão e o cajado, deixados como penhor. 
Judá é traído pela incapacidade de reconhecer a verdade assim como traíra o pai Jacó, fazendo-o crer que José estava morto. O objeto do engano é o mesmo: uma veste que parece ser o que não é. Jacó também fora enganado ao ver as vestes do filho e pensar que havia morrido. Aliás, o sangue nas vestes de José pertencia a um cabrito morto para forjar a mentira. Judá promete um cabrito para encobrir a verdade de seu relacionamento com a suposta prostituta. 
O ciclo das histórias de Jacó parece ser cheio do que de maneira popular chamamos aqui se faz, aqui se paga: Jacó engana o pai Isaac e depois é enganado pelos filhos; Judá engana o pai Jacó e depois é enganado por Tamar; os irmãos mais novos de José enganam o pai e depois são enganados pelo irmão. 

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